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quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Pensamentos de Um Suicida

Corri para o vazio e saltei; simples assim. Um pulo para encarar a verdade imutável do mundo, a certeza das gerações. Corto o ar como uma flecha, um projétil lançado contra o concreto. Um abraço carinhoso na morte que se aproxima, esguia e implacável. E por que haveria de ser diferente? Tive a coragem suficiente – ou a loucura, se é que há diferença – de tomar uma decisão; escolher o rumo da minha própria vida. Vida que não tem mais importância, o valor de tudo o que carregava foi perdido há muito tempo. Que a solução seja, então, este mergulho; único; um fim em si mesmo.
          É engraçado saber o que os suicidas pensam. As cenas de tristeza e desgraça não passam mais pela minha cabeça; só existe o sentimento de euforia, um veneno que corre pelas minhas veias impulsionado por um coração em disparada. Morrer, morrer, morrer! Mal posso esperar para provar isto, a única e a melhor saída. Sem mais escolhas agora, sem dúvidas. Apenas esta última reflexão. Sorrio com a situação e uma gargalhada fica para trás, reverberando na ruína do mundo.
          Problemas ficaram espalhados lá em cima, no parapeito do prédio, pois em minha decisão não há espaço para eles. O mundo, que antes se apresentava pequeninho lá em baixo, vai tomando forma, recuperando a nitidez horrorosa. Mas estou quase chegando; pelo menos vencerei esta barreira. Um impacto para despedaçar tudo o que já existiu. E isto significa algo: libertação.

domingo, 26 de setembro de 2010

O Guia do Mochileiro das Galáxias (Douglas Adams)


O Guia do Mochileiro das Galáxias é o primeiro livro dos cinco que compõem a série escrita pelo inglês Douglas Adams. A própria série é comumente chamada pelo título de seu primeiro livro. Trata-se, antes de tudo, de uma história de ficção - muitas vezes exagerada -.Contudo, por trás da história há uma pesada crítica do mundo em muitos aspectos: política, cultura, relações sociais... Este primeiro volume começou a ser escrito em 1979 como uma série de rádio, mas ganhou facilmente lugar nas estantes de milhões de leitores.
          A história começa com o totalmente humano Arthur Dent defendendo sua casa contra a demolição, ordenada pelo Conselho Municipal para construção de um desvio. Mais tarde, deitado no chão para impedir o avanço dos tratores, Arthur recebe a visita de seu amigo, não totalmente humano, Ford Prefect. Convencendo Arthur a sair dali, Ford o leva até um bar e dá a simples notícia de que a Terra estava na iminência de ser destruída. É a partir deste ponto que os dois viajam o universo, inicialmente pegando carona justamente na nave que aniquilou com o planeta.
          Em muitos pontos o livro é um tanto confuso, principalmente quando o autor começa a tratar das viagens no tempo. O leitor sente-se um pouco perdido, sem saber em que dimensão de tempo a história se encontra. Entretanto, as qualidades da boa mão de Douglas Adams para a escrita compensam qualquer detalhe que possa gerar confusão. A trama apresenta formas divertidas de encarar a criação do mundo e para a resposta sobre "a vida, o universo e tudo mais". Há muitas situação engraçadas que nos fazem lembrar da política e suas peculiariedades. As relações entre os "seres" também são postas em xeque, como na história de uma criatura que, sendo imortal, comprometeu-se a insultar todas as coisas vivas no universo.
          Este é um livro que, com um pouco de paciência, surpreenderá cada leitor. Certamente recomendado.

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Mate-me

Se houvesse uma saída, eu já a teria encontrado. Se existissem amigos, simplesmente não teriam ido embora. Hipócritas. Muitos me falavam sobre ajuda, que estariam ao meu lado, mas quando os procuro percebo que não há ninguém comigo. Minha mente parece viver em um sonho; devaneio febril, histérico com um grito. Penso em como vim parar aqui, preso nesta cama. Julgam-me louco, uma ameaça para a sociedade decadente. Pois digo que a sociedade é uma ameaça para minha sanidade. Aquele mundo de estranhos e incoerentes.
          Quando estou acordado tento me soltar, agito meu corpo em agonia. Tudo em vão; malditas amarras. Apertam meu corpo, sufocam minha alma e, infelizmente, não conseguem me matar. Mantêm preso um morto-vivo; algo que já desistiu da vida há muito tempo. Nas várias madrugadas em que me peguei desperto, encarei a total escuridão. Abro e fecho os olhos nestas ocasiões. Escuridão dentro... Escuridão fora. Ouço apenas sons vindos dos outros corpos. Parecem estar perto, mas não posso tocá-los.
          Procurei a morte de muitas formas. Todas frustradas. Prendo a respiração desejando morrer, mas meus instintos vêm à tona e me obrigam a tragar o ar asséptico. Começo então a rir. Um riso desvairado. O que as pobres vidas ao meu lado ouvem é uma seqüência insana de gritos. Certamente reconhecem o clamor de uma alma que não deseja mais tudo isso.

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Algo diferente...

No post de hoje apresentarei algumas ideias diferentes do que normalmente venho colocando aqui no blog. Não haverá um conto meu ou alguma análise de livro, mas sim um assunto completamente diferente e de importância inquestionável para todos nós: eleições. Mas não se desespere, sei que o assunto, muitas vezes, impede a continuidade da leitura. Assim, serei breve.
          No final de semana e nesta segunda-feira li bastante coisa sobre os candidatos à presidência de nossa querida República. O que me supreendeu positivamente foram as propostas da Marina Silva. Ainda não tinha pensado sobre ela com a seriedade devida, mas desta vez, quando parei para ler a respeito vi que temos uma candidata que, graças a Deus, é coerente em suas propostas. Propostas de um país sustentável, em resumo. Contudo, não são ideias de um eco-obsessivo que nem ao menos imaginou quais seriam as consequencias da prática daquilo que propõem. Diferentemente disso, Marina Silva apresenta de forma inteligente uma série de medidas para tornar o Brasil, ao longo do tempo, um lugar melhor para se viver, mas sem jamais deixar de lado o progresso que já foi conseguido. A prova cabal de sua coerência foi vista na entrevista que a candidata concedeu hoje ao programa Bom dia Brasil. Quando perguntada sobre a exploração do pré-sal pela Petrobras, Marina mostrou-se a favor, argumentando a necessidade da exploração do petróleo para manutenção do crescimento, mas buscando sempre a substituição do uso de combustíveis fósseis por alternativas mais verdes e, da mesma forma, viáveis.(leiam a matéria acessando o link do final deste post).
          Além disso, Marina é a única candidata que procura não atacar seus adversários. Não rejeita por completo os programas de governo. Tem uma proposta de utilizar o que já foi feito de bom para melhorar ainda mais nosso país, sem desperdiçar o volumoso dinheiro já gasto em centenas de obras e programas realizados e pensados nas gestões anteriores. Para terminar, sugiro que cada um procure conhecer melhor os planos de governo de seu candidato e pensar se é isto mesmo que desejam.



http://g1.globo.com/bom-dia-brasil/noticia/2010/09/marina-silva-fala-sobre-plano-de-governo-em-entrevista-ao-bom-dia.html

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Fragmentos da Lucidez (Um Grito de Liberdade)

Acordei em um lugar estranho; um quarto bagunçado, com fotos e fatos jogados pelos cantos. Acordei na hora errada, pois minha vida já havia partido; então fiquei só. A luz de um dia nublado entrava triste pela única janela do cômodo, cobrindo tudo com um tom de cinza. Olhei a janela de longe. Molduras de madeira com tinta descascada e vidros empoeirados. Hesitava em me aproximar mais dela, em sair de onde estava e encarar o que havia lá fora.
          Tentava outra vez dormir quando bateram à porta daquele quarto. Batidas desesperadas, mas não havia voz. Nenhuma voz pedia ajuda, ninguém gritava por socorro. Nada, apenas as batidas ocas que começavam a diminuir de ritmo. Disse para que entrasse, e ela abriu-se devagar, como se fosse empurrada lentamente. E qual não foi minha surpresa quando, totalmente aberta, vi que não havia ninguém lá; apenas uma sobra que lutava contra a luz cinza de meu quarto para poder passar pelo umbral da porta.
          Havia um copo de água e uma arma ao lado de onde havia dormido. Tentei beber, e na outra mão segurei firma o revólver. A água era de um gosto amargo, de desesperança, desistência. Mas bebi tudo, não deixei uma gota sequer. De onde estava, olhei outra vez para a janela e seu vidro empoeirado pelo passado. Sorri quando consegui levantar a arma e apontar para a janela. Vi o martelo esgueirando-se para trás enquanto o cilindro girava para deixar a próxima bala alinhada no cano. Ri alto enquanto os estilhaços de vidro pipocavam no chão de madeira. Então o ar, novo e fresco, tomou o quarto de assalto, uma onda após a outra. Ondas cheias de vida, talvez. Respirei fundo três vezes e caminhei para ver o mundo que nem lembrava mais como era. Quando dei por mim, já saía daquele quarto. E, desta vez para minha surpresa, alguém esperava do lado de fora com um sorriso e palavras doces.

terça-feira, 14 de setembro de 2010

A Crônica do Matador do Rei (O Nome do Vento) - Patrick Rothfuss


          Se existe um livro que merece absolutamente todos os elogios feitos é O Nome do Vento, o primeiro da série A Crônica do Matador do Rei. Este é o romance de estreia do americano Patrick Rothfuss; e que estreia! Uma trama que faz a mente viajar e acompanhar Kvothe, o herói (ou não) do livro, pelos mais diversos lugares: desde sua pobre infância até os dias na Universidade. Escrito de uma forma gostosa, que flui perfeitamente para criar dinamismo na história.
          O Nome do Vento é um livro de ficção, mas sem a costumeira avalanche de nomes e lugares complicados até de falar que algumas vezes deixam o leitor perdido. O autor consegue carregar quem lê a história para um lugar familiar, conseguindo até mesmo que o leitor sinta as angústias e desejos do herói-vilão. Kvothe, o personagem principal, ganha aspectos e algumas características muito próximas às pessoas comuns. Contudo, possui outras que o destacam em meio à multidão, mas sem nunca deixar escapar a tênue linha que o liga ao que seria, talvez, humano. A trama se desenrola com Kvothe contando sua própria história para outra pessoa. É uma autobiografia do próprio protagonista, envolvida em mistério e ação.
          Leitura altamente recomendada para quem gosta de boas histórias de aventura. Belíssimo trabalho de Patrick Rothfuss; O Nome do Vento tem muito boas chances de se tornar referência do gênero, tanto pela ótima história que apresentou no Primeiro Dia da saga, quanto pelo talento de seu autor.

quinta-feira, 9 de setembro de 2010

Estranha companhia

Quando ando pela casa, sozinho e no escuro, tenho sempre a impressão de que alguém me segue. Não. Irei me corrigir. Alguém, de fato, me segue. Não me importo, na maioria das vezes, não ligo mais para ele. Talvez seja por que ele já se transformou em uma espécie de amigo, e justamente por isto penso que deseje me matar. Um pouco contraditório para aqueles que não o conhecem, mas eu compreendo. Pois que o faça quando quiser. Contudo, no início, quando a doença me consumia e eu tinha medo, ele me ajudou. Mostrou que não poderia hesitar diante da morte, que toda chance de provar a doce sensação da vida esvaindo-se de um ser deveria ser aproveitada, tal como a brisa que nos encontra de assalto a beira-mar.
          - Beba o sangue – certa vez me disse com um leve tom de sugestão, mas firme o suficiente para que eu cumprisse. E, claro, bebi. Daquelas primeiras noites em diante, não pude mais ser indiferente a tudo isto.
          Cada vítima, cada corte. O sangue quente brotando de baixo do bisturi e, logo em seguida, tocando a ponta dos meus dedos que apertam firmemente contra o corpo humano teso na mesa. É como um vício, uma droga potente que nos impele a consumi-la só mais uma vez, uma última vez. Mas a vontade nunca passa.
          - Por favor... Por favor... – Elas sempre choramingam. Gostaria de, pelo menos em algumas vezes, ouvir algo diferente. Vítimas choronas, isto que são. Contudo, não faço muita questão. Depois que os cortes se aprofundam, depois que o sangue brota num fluxo ritmado, só sinto prazer.
          O que me preocupa não é a estranha companhia, mas sim as coisas que ela me sussurrou nos últimos dias.
          - Vê aquela lâmina? – Perguntava baixinho. – Use-a em você mesmo, eis a cura. Use-a! – E em cada palavra eu senti algo perverso. Mas, ele sempre me guiou, ajudando-me.
          Nesta madrugada resolvi encarar seus olhos, e tudo que vi foi o terror acumulado nos corpos que lotam meu porão. Devo me juntar à eles.

segunda-feira, 6 de setembro de 2010

Crônicas Saxônicas (Bernard Cornwell) - Uma série que vale a pena

Se você é apaixonado por história - especialmente pela idade média -, certamente não poderá deixar de ler os livros da série Crônicas Saxônicas, escritos habilmente por Bernard Cornwell.
          A história é contada por Uthred, personagem fictício que se envolve em elementos reais da história inglesa. Quando menino, o protagonista saxão perde o pai em uma batalha contra invasores vikings e por eles é capturado. É justamente com os vikings que Uthred aprende a arte de fazer guerra. Sua ações serão quase sempre guiadas pelos juramentos - pois um homem precisa ser honrado e seguí-los - e pelo desejo de reconquistar a fortaleza onde morava quando menino.
          Os livros da série Crônicas Saxônicas agradarão até os mais críticos leitores, que em certo momento se encontrarão em meio ao sangue e fedor das batalhas, como o próprio Uthred diria. Acima do romance muito bem escrito, está uma riqueza de fatos e detalhes da história inglesa que servem como aulas. Muito das duas culturas, dinamarquesa - trazida pelos vikings - e inglesa, pode ser apreendido de forma dinâmica. O autor coloca no início de capa livro mapas básicos para a localização geográfica do leitor e nomes originais dos mais diversos lugares. No final de cada obra há a seção 'Nota Histórica', onde Bernard Cornwell separa a história das pinceladas rápidas e precisas de sua ficção.

Até o momento, os livros da série lançados no Brasil foram:

O Último Reino (Livro 1)
O Cavaleiro da Morte (Livro 2)
Os Senhores do Norte (Livro 3)
A Canção da Espada (Livro 4)
Terra em Chamas (Livro 5)

sexta-feira, 3 de setembro de 2010

A Morte Que Ninguém Viu

No dia em que comecei a morrer eu ainda procurava por muitas coisas. Buscava dias melhores, oportunidades, chances e felicidade. Acabei desistindo de cada uma delas e apenas esperei. Não me importava com as horas, pois elas perderam completamente o sentido. Via o mundo passar e percebi que em tudo havia um ritmo, uma melodia, um tempo. Os homens sempre passaram rápido, na maioria das vezes vestidos para o escritório, e não me viam. Em alguns dias o silêncio era maior, e, se prestasse atenção, podia ouvir as folhas secas estalando embaixo dos passos rápidos na calçada. Nestes tempos de silêncio tudo parecia parar para respirar. E quem sabe era isto mesmo, como alguém que diminui o ritmo e senta ao longo da estrada, olha tudo enquanto traga o máximo de ar para dentro dos pulmões até eles estarem bem cheios, depois começa a esvaziá-los devagar, de olhos fechados.
          Eu não era o mais feliz dos homens, mas talvez um dos mais sábios. Quem me viu pensou que não poderia haver sabedoria em mim, claro. Estive a margem do que é considerado civilizado por quase toda a minha vida. Quase, por que também, como muitos, tive um lar, onde também havia uma família. Mas perdi tudo. Considero-me sábio não por estar nesta situação medonha, mas sábio justamente por concluir que minha vida valia a pena quando existiam pessoas que me amavam.
          Encontrei um refúgio aqui, em uma cama concreto que jamais esquenta. Aprendi a conviver com isso, mas agora não preciso de mais nada. Nem do mundo necessito mais. Senti muito frio desde quando as luzes da rua se acenderam instantes atrás. Ouvi, há pouco, um dos homens que passavam dizer que este era o pior inverno dos últimos anos e que estava ansioso por chegar em casa, assim como eu. E ele estava certo, por que neste inverno houve um momento que o frio começou a diminuir e eu soube o que era. Minha mente vagou pela rua onde durmo. Perto da esquina olhou na direção do meu corpo, e o que viu? Viu uma sombra imóvel contra um muro, não mais uma vida. Viu uma figura deitada na calçada, coberta por jornais, mas agora o vapor da respiração tinha sumido. O ritmo do mundo e das coisas diminuiu aos poucos, e, quem sabe, com sorte, eu morri.